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Gestão, o grande desafio do varejo de vizinhança
Mais de um milhão. Estimativas do mercado apontam que passa de um milhão o
número de pontos de venda do país, sendo que boa parte são os varejos de
vizinhança, lojas espalhadas por todo país e que há anos se destacam, crescem e se
consolidam na preferência dos brasileiros, isso ao mesmo tempo em que o mercado
vê o cash & carry, ou atacarejo, ganhar espaço e crescer como escolha do
consumidor.
Alguns fatores como mudanças de ordem econômica, cultural, impactos no poder
de consumo, busca por conveniência, praticidade, proximidade e até a relação
direta com o cliente, favorecem o pequeno varejo frente a concorrência do
mercado. “Não é à toa que inúmeras grandes redes passaram a investir pesado no
mercado de vizinhança. Há ainda muitas oportunidades, nichos pouco explorados,
serviços a serem desenvolvidos, melhoria no atendimento, entre outros”, comenta
Fátima Merlin, sócia fundadora da Connect Shopper. Segundo ela, tradicionalmente
o varejo de vizinhança é caracterizado pelas compras picadas, de necessidades
específicas, compra de reposição. “É um modelo enxuto, com uma média de dois a
quatro mil itens”, diz.
Os últimos dois anos não foram animadores para os varejos ou mercados de
vizinhança, afirma Marco Aurélio Lima, diretor de negócios da GfK. “Os resultados
foram pífios e esse período bem desafiador. Porém, é um canal que, com a
retomada do poder de compra das famílias e a estabilidade econômica, voltará a
crescer num ritmo mais acelerado que os demais”, avalia Lima.
Mas esse crescimento não está atrelado apenas à economia ou retomada do poder
de compra da população. Há muito trabalho a se fazer para que o varejo de
vizinhança dê um salto em participação de mercado. Olegário Araújo, cofundador da
Inteligência360, destaca que para os varejistas independentes ou que pertençam a
centrais de negócios, o maior desafio é melhorar a gestão.
“Essa melhor gestão implica em ter um controle dos estoques, acompanhar a
margem bruta e também o fluxo de caixa. Conseguir acompanhar as novidades em
termos de lançamento, mas tudo isso precisa ser adequado ao público alvo da loja.
Para isso, a empresa precisa conhecer seus clientes”, avalia. Araújo ainda faz um
alerta: “um equívoco comum, cometido por essas empresas é querer acompanhar o
preço praticado pelo atacarejo para o consumidor final.
Além de não ter economia de escala para isso, a margem não é calculada
corretamente e o preço pode ser estabelecido de forma indevida, comprometendo
a saúde financeira da empresa. Essas empresas têm o benefício da proximidade com
o cliente e deveriam fazer uso desse conhecimento do chão de loja e da sua
agilidade para promover ajustes na loja para servir melhor”.
Gestão, o grande desafio
O grande desafio deste canal, que é “calcanhar de Aquiles” dos seus donos, é a
gestão da loja. “No Brasil, temos muitas lojas que começaram pelo espírito
empreendedor de seus fundadores, mas que precisam melhorar sua gestão para
que continuem crescendo”, comenta Lima. Para ele, em gestão, fala-se de um
controle financeiro, uma gestão adequada de estoque e perdas, conhecer as
necessidades do consumidor, planejar algo em relação ao gerenciamento de
categorias, gestão de pessoas (colaboradores), e por último investimento certeiro
em tecnologia no ponto de venda.
“Para tudo isso, o responsável ou dono da loja precisa gastar tempo em
treinamentos, cursos ou melhorar sua escolaridade, com intuito de fazer crescer o
estabelecimento”, avalia. Lima ainda destaca que existe um outro desafio neste
canal que é a relação com fornecedores, pois o mercado caminha para algo mais
digital (e-commerce), mas sem perder sua humanidade. “A continuidade e
fidelidade com seus fornecedores é fundamental!”, diz.
E como parte do processo de gestão é preciso destacar a relação da loja com o
cliente e para isso é preciso conhecer o perfil do shopper para estreitar o
relacionamento e entregar, de fato, o valor que o cliente busca naquele ponto de
venda. “Hoje contamos com inúmeras ferramentas e metodologias disponíveis no
mercado para lidar com a complexidade no entendimento do comportamento do shopper
nos dias atuais, entendendo quem é ele, como se comporta quando vai às compras, o que
pensa e como age durante a compra, as motivações que explicam tais
comportamentos e o processo de tomada de decisões, entre outros”, comenta
Fátima Merlin.
Ela destaca que há os tradicionais métodos de pesquisa como, por exemplo, os
grupos de discussão, entrevistas pessoais, observações de compra no ponto de
venda, entre outros e a eles somam-se técnicas mais modernas e novas
metodologias com o objetivo de se obter maior precisão e consistência nos estudos
de shopper. Há ainda cartões de fidelidade, CRM, entre outros.
Para Fátima há ainda outros três grandes desafios varejo de vizinhança. O primeiro
deles está em conseguir positivar os produtos frente a um cenário de pouco espaço
das lojas e grande quantidade de produtos. Em segundo, lutar contra a ruptura e em
terceiro lugar, executar as ações de forma adequada, seja na exposição e no uso dos
materiais de comunicação e ações de merchandising. “A maioria nunca viu e às
vezes nem sabe o que é planograma. Para piorar, não há práticas contínuas de
monitoramento e estatísticas sobre as ações que são executadas e a efetividade das
mesmas.
Faz-se muitas coisas, mas não necessariamente são adequadas e eficientes
para obter o resultado esperado e fazer o cliente voltar”, alerta. A recomendação da
especialista é organizar as ações a partir da jornada de compra do shopper – através
da qual, se deve mapear o comportamento e decisões a partir do
desejo/necessidade por um produto, marca e canal, e se estender até a avaliação
final da experiência de compra. “Com isso, é possível, estruturar e desenhar ações
assertivas em todos os pontos de contatos com os clientes. O primeiro passo da
jornada de compra do Shopper nada mais é do que permitir que o consumidor
tenha o conhecimento do produto e ou canal de compra/loja”, orienta.
Serviços, caminhos para a diferenciação
Oferecer serviços que gerem maior conveniência e personalizem as ofertas são
formas de avançar e se diferenciar quando o assunto é oferecer diferenciais ao
shopper. E não pense que é preciso bolar estratégias mirabolantes para isso.
Olegário Araújo conta que há empresas que fazem uso das mídias sociais para
divulgar o “pão quentinho” que está saindo, por exemplo.
Há também aquelas que atendem pedidos pelo WhatsApp e entregam a domicílio, o
que facilita a vida do cliente. “A loja de vizinhança pode fazer uso da tecnologia para
oferecer praticidade para seus principais clientes. Alguns negócios já utilizam o
WhatsApp business para oferecer tal comunidade. Mas é vital aqui conhecer os
principais clientes. Os funcionários da loja podem ajudar a mapeá-los”, comenta
Araújo.
Estudos anuais da GfK mostram um crescimento em vários serviços ou produtos,
com o objetivo de melhorar o relacionamento com os consumidores.
“Veja por exemplo o aumento de lojas que já oferecem produtos Orgânicos, algo importante
para o consumidor e um segmento em crescimento. Também podemos pensar no
número crescente de lojas que oferecem outros serviços, como: peixaria, padaria,
entrega à domicílio, diferentes formas de pagamento, açougue, bazar, etc. Em nossa
pesquisa sabemos que 11% das lojas do mercado de vizinhança estão vendendo
eletrodomésticos também. Os estabelecimentos estão se adaptando cada vez mais
às necessidades de seus consumidores”, comenta Lima.
O cliente
Com uma pulverização tão grande de lojas e com uma dimensão gigantesca de
territórios é difícil traçar um perfil exato do shopper do varejo de vizinhança. Marco
Aurélio Lima, da GfK, prefere falar que o público do mercado de vizinhança não tem
relação com idade, gênero ou classe social. “São todas as pessoas que buscam uma
maior praticidade e comodidade para o seu dia-a-dia. É uma relação mais
comportamento do que social. Temos de levar em consideração que o termo
“proximidade” é a grande tônica deste canal”, afirma.
Já Olegário Araújo destaca que para tentar definir o perfil desse shopper é preciso
considerar que há diferentes tipos de clientes e ainda variantes como a localização
da loja e qual o papel que a mesma cumpre na jornada de compra do cliente. “A
grande média aponta para pequenas compras, mas a pequena compra hoje, se for
de uma pessoa que mora sozinha, é uma compra de “abastecimento”. Hoje, temos
muitos domicílios com apenas um ou dois moradores com mais de 60 anos, mas
também temos lares com jovens que moram sozinhos. São hábitos de compras bem
diferentes”, relata.
Transformações para o futuro
A primeira transformação pela qual o varejo de vizinhança deve passar nos próximos
anos é, segundo Lima, o aprimoramento da gestão das lojas. “Percebo ao longo dos
anos, muitos varejistas preocupados em melhorar cada vez mais. Porém, devemos
ver também um crescimento no número de lojas através das grandes redes de
varejo, pois estão percebendo a importância de investir neste canal.
E por último acho que a tecnologia vai facilitar muito a vida das pessoas, isto é,
usar a tecnologia como meio para aproximar a loja do consumidor”, diz.
Além disso, em uma concorrência mais acirrada e vão se destacar as empresas cujos
sócios tenham a habilidade de ouvir seus colaboradores e clientes para promover
melhorias na loja em linha com as necessidades e desejos dos mesmos. “Aqueles
que aprimorarem a gestão para ter o sortimento atualizado e adequado aos clientes
com boa gestão de estoque e também de precificação vão se destacar”, comenta
Araújo.
Para ele, aplicar um markup para todos os itens pode ser simples de executar, mas
não pode levar a empresa a perder a competitividade ou perder rentabilidade. “Vai
ter que ter “sangue frio” para não querer acompanhar o preço do atacarejo e
também ter consciência de que algumas categorias hoje o cliente compra pelo e-
commerce, o que vai desde cerveja, vinho, fraldas, entre outros”, avalia.
Araújo ainda destaca que o empresário terá que conhecer melhor o cliente, a
concorrência, ter ciência de seus pontos fracos e fortes e saber promover seus
pontos fortes. “A concorrência vai ficar mais acirrada e as grandes redes continuarão
crescendo em direção ao “interior do interior”, ou seja, para as pequenas cidades.
Elas crescerão com lojas físicas e e-commerce”, finaliza Araújo.
Cinco dicas para melhorar a gestão do negócio:
Conhecer o shopper
Ter clareza no propósito da empresa
Ter uma equipe engajada, capacitada, treinada e motivada
Planejar ações e entregar o que promete
Cuidar da empresa nos detalhes: produto certo, organização, promoções
inteligentes, sinalização, precificação, atendimento e exposição
Fonte: Newtrade