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Liderando pela primeira vez
Trabalho há muitos anos no meio corporativo convivendo com pequenas, médias ou
grandes empresas, de diversos setores como serviços, comércio ou indústria e um
dos pontos mais comuns que percebo em todas as empresas é o desafio de
desenvolvimento de uma pessoa para seu primeiro cargo de líder.
Provavelmente um dos maiores desafios na carreira dos profissionais está nesta
fase. Normalmente, por ser um excelente profissional técnico, ele acaba sendo
promovido ao seu primeiro cargo de gestor. Neste caso, muitas vezes aquela
máxima “perdemos um excelente vendedor e ganhamos um péssimo gerente de
vendas” pode ser muito verdadeira.
O profissional tem um grande desempenho técnico e isto o faz ser promovido, mas
mais à frente percebe-se que as habilidades comportamentais serão muito mais
importantes na nova função que os conhecimentos técnicos. Conhecimento técnico
não se discute, pois, os profissionais devem ter de maneira profunda e atualizada.
As diferenças estão nas habilidades e atitudes.
Esse novo gestor deverá trabalhar com pessoas e alcançar suas metas com base no
apoio de pares, funcionários e líderes. E este pode ser o drama: trabalhar com
pessoas.
Neste momento o novo gestor começa a perceber que algumas as pessoas têm
agendas ocultas e muito diferentes dos objetivos empresariais que tanto ele gestor,
deseja alcançar. Os interesses são díspares e por mais que as muitas pessoas
prometam tudo na frente do novo gestor a prática mostra que vários funcionários
caminham em direções totalmente opostas. Isso sem falar nos seus pares.
Quando se tem sucesso pode até piorar, pois em alguns lugares o sucesso incomoda
o status das pessoas adormecidas profissionalmente. Infelizmente o sucesso pode
ser visto como um insulto ou prepotência para os desavisados das boas práticas de
gestão.
Sou professor universitário e quando toco neste assunto com os alunos sou
procurado ao final de aula e escuto: “Professor, parece que você trabalha na minha
empresa. Você ia falando e eu via um filme na minha cabeça. Parecia real”.
Sempre digo que não pareceu real, foi real. As empresas são muito parecidas, pois
todas têm pessoas e isto as torna muito semelhantes. Agora, quanto mais alinhadas
as pessoas estiverem com a cultura organizacional, valores e visão empresarial este
quadro tende a ser melhor. É como se estivéssemos todos no mesmo barco,
dependendo uns dos outros e sempre compartilhando um bem comum.
Este é o desafio: lidar com pessoas, mas desafio mesmo é liderar líderes, mas este
será assunto para outro artigo. Quando você não é gestor, a sua agenda é
normalmente decidida por você e seu líder em linhas gerais, mas o dia a dia fica com
você. Tanto você se saiu bem que foi promovido a líder, e agora?
Você sempre entregou no prazo, sem erros e com qualidade. Assim batia suas
metas. Agora vai ter que alcançar os objetivos contando com a ajuda de pares e
funcionários. No entanto, rapidamente percebe a agenda oculta e o primeiro passo
que decide tomar é, centralizar. Isto acontece para os novos gestores que percebem
a agenda oculta, as entrelinhas, o verdadeiro lado escondido das relações pessoas.
Para o novo gestor que reluta em perceber este lado oculto da empresa o destino
pode ser a rua rapidamente.
Você centraliza para garantir prazo, qualidade e precisão, características que você
sempre trouxe para o seu trabalho e que te faziam alcançar os objetivos e, portanto,
ganhou a promoção. O problema é que fazendo isso você acumula o trabalho e não
desenvolve a equipe. Como resultados: conflitos entre você e a equipe, atraso na
entrega, erros, dificuldade para se movimentar na carreira e objetivos não
alcançados.
Muitos novos gestores nesta situação apertam mais ainda as relações, reclamam
dos funcionários e não têm a sensibilidade para perceber que o problema está com
ele mesmo, o novo chefe. Para a doce vida do funcionário mediano não há nada
melhor: o chefe faz tudo e decide sozinho.
A produtividade individual cai e sua área se divide em dois mundos distantes: você e
sua equipe. Não há cenário pior. Claro, sem contar com os oportunistas de plantão
que percebem uma boa hora para pegar o seu lugar.
Os especialistas nos mostram que 83% dos gestores desligados são mandados
embora pelo comportamento e 17% por motivos técnicos. A máxima é: contratamos
pelos conhecimentos e desligamos pelo comportamento. O quadro é cruel, mas
desafiador. Muitas são as recompensas ao novo líder e a melhor além da financeira
é o sentimento de construção de algo: uma área referência na empresa, uma equipe
desenvolvida e uma carreira promissora.
Mas lembre-se e nunca esqueça: o desafio é lidar com pessoas. O primeiro passo
para ter sucesso com este desafio é focar no desenvolvimento da sua equipe. Alguns
gestores, por insegurança, têm medo de preparar funcionários ou sucessores. Ledo
engano, com pessoas qualificadas na equipe você estará livre para progredir na
carreira e fazer relacionamentos. Talvez o inverso seja melhor: fazer
relacionamentos e progredir na carreira.
Você pode estar lendo este artigo bem nesta fase de transição de carreira, e gostaria
de ter lido que as empresas são cor de rosa e que agora, depois da sua promoção,
todos se curvarão aos seus desejos e os objetivos serão alcançados, salvo por
problemas técnicos.
Não seria correto eu afirmar que as empresas são cor de rosa, mas são deliciosas se
você aprender a lidar com pessoas. E olhe que não é difícil lidar com pessoas,
apenas temos de ter uma boa dose de sensibilidade, estrutura emocional
equilibrada e não colocarmos nossas fantasias no centro dos relacionamentos.
Pense nisto.
* Armando Lourenzo é presidente do Instituto da Ernst & Young e professor da FIA,
USP e Casa do Saber.
Fonte: Administradores